Especialista explica e faz alerta sobre estratégia de políticos que decidem receber demandas pelo aplicativo
WhatsApp: é popular e há planos nas operadoras específicos para acesso ao aplicativo | Foto: Alexandre Parrode
As redes sociais são, sem dúvida, ferramentas imprescindíveis para o sucesso (ou fiasco) de políticos por todo o globo. Assistimos, no ano passado, a maior potência mundial eleger um presidente que teve como principal plataforma de campanha a internet: Donald Trump pode não ser exatamente o líder que se esperava, mas ninguém pode questionar seu sucesso no universo virtual.
No Brasil, apesar de ainda estarmos engatinhando no que diz respeito a itens básicos, como acesso da população e qualidade do serviço, a internet deve ser uma grande arma na guerra de 2018. Basta dar uma rápida “googlada” para perceber que quase todos os pré-candidatos têm compartilhado pensamentos no Facebook, tuitado algum comentário no Twitter, postado aquela foto com o povo no Instagram e gravado vídeo se posicionando sobre determinado tema no Youtube.
Os que ainda não aderiram às redes sociais correm o risco de não retornar aos cargos a partir de 2019.
Neste cenário nebuloso de crise política, econômica e moral que enfrentamos atualmente, diversos homens públicos têm buscado maneiras de se aproximar da sociedade. Se a descrença e a aversão à classe política (a febre dos anti-políticos é real) dominam a opinião pública, há aqueles que apostam na inovação: em vez de se enclausurarem nos gabinetes, discutindo com marqueteiros como superar o descrédito geral, optam por “colocar o bloco na rua”.
Além dos tradicionais perfis no Facebook, Twitter, Instagram e afins, alguns políticos goianos estão apostando em um canal ainda mais direto com a população: o WhatsApp. Aplicativo de mensagens que revolucionou a comunicação moderna, virou item imprescindível inclusive na área de negócios — profissionais liberais, pequenas e micro-empresas e até grandes corporações ganham dinheiro com o “zap zap” (como é popularmente chamado no Brasil).
Atentos à oportunidade, parlamentares de Goiás disponibilizaram números de celular para que a população envie demandas, pedidos, sugestões, reclamações e até projetos pelo WhatsApp.
Sem barreiras
Vereadores Jorge Kajuru, Delegado Eduardo Prado e Lucas Kitão: pioneiros | Fotos: Alberto Maia e Eduardo Nogueira/ Câmara de Goiânia
Na Câmara Municipal de Goiânia, três vereadores instituíram o que chamam de “gabinete virtual”. O radialista Jorge Kajuru (PRP), eleito com a maior votação da história da capital, é referência no uso das redes sociais — possui 22, entre canal no Youtube, e perfis e páginas no Faceebok. No WhatsApp, que disponibiliza aos seguidores desde a eleição de 2014 (quando concorreu a deputado federal), comanda mais de 26,6 mil grupos e tem pelo menos 1,6 milhões de contatos.
“Resolvi utilizar o WhatsApp na campanha, pois estava muito doente e havia passado por uma cirurgia muito grave, então tive que ficar trancado em um apartamento aqui em Goiânia. Boni da TV Globo que me deu a ideia de fazer minha eleição no aplicativo, por meio de grupos. Dai comecei a conversar com amigos e acabou virando corrente. Hoje minha maior audiência é no ‘zap’, competindo ‘pau a pau’ com meus perfis no Facebook”, explicou.
Para Kajuru, apenas três redes sociais em que valem a pena investir: Facebook, YouTube e WhatsApp. “São formas diretas para conversar com as pessoas, entender o que mais reclamam e, principalmente, saber aquilo que elas mais anseiam. É um feedback, recebo muitas críticas construtivas e isso que é importante”, completou.
Como a quantidade de mensagens que recebe diariamente é enorme (estima que cerca de 4 mil), o líder do PRP tem uma equipe de 12 pessoas que se revezam para não deixar ninguém sem resposta. Independente do conteúdo, todos são atendidos: “Senão acaba o respeito.”
Também com grande número de seguidores no universo online, o novato Delegado Eduardo Prado (PV) conta que tem experiência de longas datas com o WhatsApp. Desde quando era apenas delegado da Polícia Civil de Goiás, disponibilizava seu número para a população. “Sempre tive contato direto com a comunidade. Minhas grandes investigações tiveram como premissa a visão da polícia comunitária e por lá que eu recebia, e recebo, denúncias, informações sobre inquéritos, enfim, de tudo”, detalhou.
Famoso por ter sido o responsável pela prisão do serial killer de Goiânia, Tiago Henrique Gomes da Rocha, que confessou ter matado 39 pessoas, o vereador do PV diz que o aplicativo facilita a aproximação com a população e quebra a barreira do espaço. “Se for esperar que as pessoas cheguem ao meu gabinete não consigo resolver nada. Visito 15 bairros por semana, dou palestras por todo estado e mantenho o contato direto com meus 400 mil seguidores nas redes sociais”, garante.
Para o delegado, o WhatsApp é ferramenta importante para ouvir a população e mostrar que políticos não são “intocáveis”. “Se colocar à disposição do cidadão é fortalecer a democracia e desconstruir a imagem tão ruim que se tem da classe política’, opinou.
Outro estreante na Câmara Municipal de Goiânia que viu no “zap zap” uma maneira de evitar a perda de contato com a população foi o jovem Lucas Kitão (PSL). Na última semana, ele apresentou seu gabinete virtual e revela que o serviço se tornou um sucesso em pouco tempo.
“Era uma forma mais rápida, dinâmica e barata de interagir com os cidadãos goianienses. A intenção é saber a dificuldade de cada região, necessidade de cada bairro e as principais demandas da cidade. Pensamos em um canal direto, que fosse popular, porque as vezes nem todos têm acesso à Câmara. É uma forma de dinamizar a comunicação, tanto quanto para as necessidades, quanto também para sugestões, ideias, críticas”, explicou.
Kitão também disponibilizou um assessor só para ficar por conta do WhatsApp e pretende complementar o canal de comunicação criando um aplicativo de seu mandato. “Todo mundo é respondido e, dependendo do caso, há encaminhamento especializado. Por exemplo, se for uma demanda jurídica, vai direto para nossos advogados. Semanalmente fazemos uma avaliação e eu ligo pessoalmente para as pessoas para saber como foram atendidos, se o problema foi resolvido, etc.”, arrematou.
O único
Francisco Jr.: deputado quer quebrar paradigmas| Foto: Renan Accioly / Jornal Opção
Já na Assembleia Legislativa de Goiás apenas um deputado investe no WhatsApp como meio de comunicação: Francisco Jr. (PSD), que ficou famoso por ter feito uma campanha com grande foco no universo virtual em 2016 (quando disputou a Prefeitura de Goiânia).
O deputado, ao contrário do vereador, é visto como um homem público que não está em contato tão direto com a população — costuma lidar mais com prefeitos, lideranças regionais e com o governo estadual. No entanto, o pessedista afirma que é justamente este paradigma que pretende quebrar com seu gabinete virtual.
“Quero deixar claro que os cidadãos podem, e devem, fazer as cobranças diretamente. O WhatsApp vem neste sentido de permitir que haja um contato de perto, com possibilidade de acompanhamento das demandas”, argumentou.
Segundo ele, o Facebook e as demais redes sociais funcionam bem para divulgar ações, dar opiniões e informar, mas só o “zap” permite um atendimento individualizado. “É uma nova etapa na comunicação mundial, porque garante a eficácia. As pessoas me encaminham ofícios, pedidos e até projetos, e são respondidas com atenção. Se é uma crítica, por exemplo, eu mesmo faço questão de responder e dar, se possível, uma explicação”, completou.
Francisco Jr. teve que disponibilizar uma equipe para dar conta do volume de mensagens, mas, aos fins de semana, traça estratégias com sua equipe e dá os devidos encaminhamentos necessários. “Sei exatamente a quantidade de demandas, elogios e críticas que recebo por semana. Dessa forma, conseguimos desenvolver um controle de qualidade do próprio mandato muito maior”, comemorou.
Diferentemente dos vereadores, cujas maiores demandas são podas de árvores, buracos nas vias, vagas em CMEIs e hospitais, o deputado explica que os pedidos são focados em agenda, emendas e projeto.
É o futuro
Professor Carlos Costa comenta uso do aplicativo para aproximar políticos de cidadãos | Foto: divulgação
Professor especialista em marketing digital do Instituto de Pós-Graduação & Graduação (Ipog), Carlos Costa explica que a estratégia é positiva, pois demonstra a sensibilidade dos parlamentares para entender o que vai bem, ou não, no mandato. “Quando se fala em redes sociais a via não é mão única, as pessoas também têm voz e é preciso ouví-las. Políticos que utilizam o WhatsApp como meio de comunicação se aproximam da sociedade, que se sente um pouco mais segura, pois vê o trabalho, o resultado”, disse.
Ele lembra que, durante a campanha, os candidatos estão sempre em contato direto com o povo e, após eleitos, não podem sumir. “O WhatsApp é, sem dúvidas, uma maneira eficiente de humanização, de manter contato mesmo à distância. As pessoas entendem que o parlamentar, mesmo que não seja ele, está respondendo, lhe dá atenção e ouve suas demandas”, completou.
Contudo, Carlos Costa faz um alerta aos políticos que decidirem abrir tal canal de comunicação: ninguém pode ficar sem resposta. “Quando se cria um WhatsApp, tem que ter consciência de que vai haver uma chuva de mensagens, pedidos e demandas 24 horas por dia. Mesmo assim, a resposta deve ser rápida, eficaz e personalizada. Do contrário, pode é prejudicar a imagem e causar perda de credibilidade”, explicou.
O especialista destaca ainda que é preciso organizar as demandas de forma sistemática por meio de uma gestão de resultados. “Deve-se utilizar os dados para traçar estratégias de trabalho e melhorar a si mesmo. Entender que aquele canal de comunicação deve servir para crescimento pessoal e político, não pode ficar perdido”, instruiu.
Nem precisa dizer que trabalhar para resolver os problemas e, de fato, dar um retorno à sociedade é imprescindível. “O básico do básico é conseguir ajudar. Aliás, mapear quais são os anseios da sociedade, onde estão os maiores gargalos e quais investimentos devem ser feitos garante uma vantagem considerável para aqueles que pretendem enfrentar as urnas nos próximos anos”, arrematou.
Fonte: Jornal Opção