Foto: Margioni BERMÚDEZ / AFP
Estratégia rara envolve espionagem, mimetismo e intensa competição entre filhotes, com o chupim brasileiro e o cuco europeu entre os principais representantes do comportamento
UOL/FOLHAPRESS
O mundo animal é repleto de curiosidades e comportamentos surpreendentes. No universo das aves, existe um hábito inusitado: colocar ovos em ninhos alheios.
O COMPORTAMENTO DAS AVES PARASITAS
Algumas espécies apresentam um comportamento reprodutivo chamado parasitismo de ninhada, que ocorre quando a fêmea deposita seu ovo no ninho de outra ave. A partir daí, o hospedeiro se torna responsável por incubar o ovo e criar o filhote como se fosse seu.
As espécies parasitas não constroem seus próprios ninhos e não cuidam da prole. Todo o processo de incubação, alimentação e proteção é “terceirizado”.
COMO FUNCIONA?
A reprodução dessas aves envolve uma verdadeira operação de espionagem. A fêmea observa possíveis ninhos e aguarda o momento ideal: geralmente logo após o hospedeiro botar seu ovo e deixar o ninho.
Em algumas ocasiões, a parasita remove um dos ovos originais para não levantar suspeitas.
O ovo do parasita costuma se desenvolver mais rápido, e o filhote nasce antes dos demais. Assim, cresce mais rapidamente, monopoliza a atenção dos pais adotivos e, dependendo da espécie, pode até eliminar a concorrência.
A bióloga Claire Spottiswoode, em entrevista ao The Guardian, explica que os filhotes parasitas competem intensamente por alimento, o que leva à morte rápida dos filhotes hospedeiros. Em algumas espécies mais agressivas, os recém-nascidos já apresentam pequenos ganchos no bico, usados para empurrar ou ferir os rivais.
E O HOSPEDEIRO NÃO PERCEBE?
Algumas aves conseguem identificar o intruso e chegam a remover o ovo estranho ou abandonar o ninho. Outras, porém, não têm essa habilidade de reconhecimento e prosseguem normalmente com a incubação.
Segundo Spottiswoode, após o nascimento, a rejeição praticamente não ocorre, porque as aves não desenvolveram mecanismos para rejeitar seus próprios filhotes. Na prática, elas “aceitam” o pequeno invasor, uma espécie de instinto parental que se sobrepõe à identificação visual.
POR QUE ISSO ACONTECE?
O parasitismo de ninhada é uma estratégia evolutiva rara, ocorrendo em apenas 1% das espécies de aves. De forma geral, alguns pássaros usam essa tática para economizar energia, já que construir ninhos e cuidar de filhotes é um processo extremamente exigente.
Claire Spottiswoode explica que “ser pai ou mãe é uma tarefa muito onerosa”. Ao delegar esse trabalho, a ave parasita pode investir mais tempo em pôr ovos e buscar outras oportunidades de reprodução.
Além disso, essas aves perderam a habilidade de construir ninhos e até o instinto de cuidado parental ao longo da evolução. Por isso, o parasitismo é visto como um comportamento normal.
BRASIL TEM UM GRANDE REPRESENTANTE
No Brasil, o maior representante desse comportamento é o chupim (Molothrus bonariensis). Para se ter ideia, é um parasita extremamente generalista: seus ovos já foram registrados em 243 espécies de aves hospedeiras. Sabiás, bem-te-vis e tico-ticos são as maiores vítimas.
O mais curioso é que, muitas vezes, o filhote do chupim se torna maior que os pais adotivos, criando cenas inusitadas na natureza. O ornitólogo Willian Menq, do canal Planeta Aves, explica que muitos hospedeiros acreditam que, por estarem alimentando um filhote grande e forte, tiveram sucesso na incubação -quando, na verdade, estão criando um parasita.
Outras espécies parasitas no Brasil incluem o peixe-frito, a iraúna-grande, o saci e o chupim-azeviche. Vale destacar que, em geral, o intruso é criado pelos pais adotivos por cerca de duas semanas, até que se tornam independentes.
Na Europa e na Ásia, o principal representante é o cuco (Cuculus canorus). Diferente do chupim, a fêmea do cuco apresenta um comportamento avançado: ela imita perfeitamente os ovos das espécies hospedeiras.
Essa técnica é chamada mimetismo de ovos. Assim, reduz drasticamente a chance de rejeição, se tornando um dos exemplos mais impressionantes de coevolução entre parasitas e hospedeiros.
Fonte: https://jornaldebrasilia.com.br/
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